terça-feira, 31 de maio de 2016

A CASA DOS SONHOS (OU SERIA: O SONHO DA CASA?)

Para minha poetisa de metáforas valiosas, Socorro Duran

          Eu vivenciei um sonho com os olhos bem abertos, mais precisamente dentro de uma casa. Tudo começou com um convite para uma confraternização literária. Esse é o tipo de festa que eu gosto e faço o possível para não perder. Porém, a festa não seria em minha cidade e eu não teria transporte para retornar à minha casa. Fui então justificar minha ausência numa mensagem. Nesse momento, uma surpresa, outro convite:
            - Venha! Você dormirá em minha casa. Será um prazer tê-la comigo!
            - Ôba! Sendo assim, pode me esperar. Chegarei às 19h:00.
            E tudo saiu como o combinado. Ao chegar à cidade do evento, liguei para a pessoa que me convidou, perguntei como faria para chegar à sua casa, pois eu nunca tinha ido lá. Essa pessoa recebeu meu telefonema com alegria na voz, perguntou-me onde eu estava e disse que iria me buscar. Fiquei esperando, ela chegou dois minutinhos depois.
Sempre que recebo um convite para dormir na casa de alguém, não espero muito quanto à recepção. Sou uma pessoa simples e idealizo apenas um colchonete, um travesseiro, um lençol, chuveiro, pronto! Para mim é o bastante. Não tenho o hábito de ficar observando o que tem ou deixa de ter na casa das pessoas que eu entro, aprendi na infância que isso é um costume muito feio. Mas não observar a beleza daquela casa foi algo impossível, porque a minha amiga fez questão de mostrar-me cada pedacinho dela. Saiu me puxando pelo braço. De antemão, confesso que fiquei encantada com tudo o que vi e tudo o que me foi relatado com riqueza de detalhe.
Logo na entrada, um belo jardim. Tem uma palmeira bem incomum que eu observei com cuidado porque gosto muito de árvores. Um terraço com móveis antigos, rústicos, muito belos. Uma imensa árvore de Natal na sala, bem ornamentada e brilhante. Voltei meus olhos para ela. Minha amiga disse logo: “Venha, vou te levar ao seu quarto!”. Era uma suíte, com três camas, para eu escolher em qual delas dormiria. E na minha cabeça: “Uma suíte? Três camas? Mas eu só precisava de um colchonetezinho...”
            As paredes eram revestidas de cultura pura. Numa delas, um quadro de outro país que foi pintado à mão, numa folha seca de uma árvore. Uma perfeição! Um presente de um amigo religioso que hoje está ao lado do Papa Francisco também estava pendurado na parede. Fotos antigas. Uma delas, era do avó montado num cavalo e bem ao fundo eu observei algo que parecia ser um cafezal. Lembrava cena de uma novela de época. Viajei naquela imagem. Nessas paredes que possuem portais mágicos para outros mundos, existiam quadros de vários lugares nacionais e internacionais. Artesanatos indígenas nas paredes de outro cômodo. Porcelanas portuguesas pintadas à mão na parede do terraço. Na do quintal, uma pintura de uma Santa, feita por uma artista especial: a neta mais velha. E acredite: uma bela pintura!
            Lá no corredor, que geralmente é um lugar que apenas dá acesso a outros cômodos da casa, eu vi livros do século passado. Nunca pensei que fosse conhecer um corredor tão culto.
Medalhas, bilhetes, fotos, histórias, num móvel que só faltava falar. Eu passaria horas naquele corredor, sem sombra de dúvidas, mas a casa era muito grande e sua dona estava ansiosa para me mostrar o restante.
            Na sala de estar, cristaleiras repletas de coisas finas. Também havia um móvel com alguns materiais de colecionador. Minha amiga é colecionadora de dedais, nunca conheci alguém que tenha tido a ideia de colecionar esse tipo de coisa. Sua coleção está perto de chegar à casa dos cem. Eu só conhecia o dedal tradicional, aquele de prata, simples. Fiquei surpresa com a diversidade desse tipo de objeto que ela conseguiu adquirir ao longo da vida. E o mais interessante é que ela não sabe costurar, ou seja, nunca precisou de um dedal na vida e tem quase cem deles! Na parede da sala, além de quadros, um relógio de corda muito bonito. No teto, lustres finíssimos.
            A cozinha tem tudo que uma boa dona de casa precisa para fazer um belo banquete, sei que nunca terei uma cozinha semelhante porque odeio cozinhar. Mas dava gosto de olhar cada detalhe daquele ambiente. Tinha uma escada que dava acesso ao primeiro andar. Fui avisada: Lá em cima temos a biblioteca do meu marido e o nosso quarto. Nesse momento bateu uma tristeza rápida. Para muitos, a cozinha é o coração de uma casa, para mim não! A biblioteca é o coração da casa e como ela estava localizada perto do quarto dos donos daquele lar, acreditei que eu não seria levada lá. É uma intimidade muito grande para uma visita de primeira viagem. Mas para a minha surpresa, fui convidada a conhecer mais esses dois cômodos.
Subimos! Meu Deus, que biblioteca! Meus olhos ficaram confusos, não sabiam para onde olhavam primeiro. Uma estante com muitos livros criteriosamente organizados, ela me garantiu que se alguém tirar algum livro dali, o marido sente falta rapidamente. Outro móvel que serve como organizador de pastas. Duas mesas, uma delas com um computador, na outra, a foto da mulher amada. Um lugar de paz, sonho de qualquer escritor. Quando eu desci, parabenizei ao marido da minha amiga e ele me deu um sorriso tímido quando eu falei:
- Sua casa é encantadora, aqui se respira cultura, mas o cômodo que eu mais gostei foi o da sua biblioteca. Que perfeição! Eu não tenho casa própria ainda, mas eu cometo a ousadia de pedir permissão para voltar aqui assim que eu puder construir a minha casa. É exatamente uma biblioteca daquela que eu preciso para mim. Venho fotografá-la!
- Fique à vontade, minha filha.
Ele é um sujeito recatado, que fala pouco e em tom de calmaria, mas quando resolve falar só diz maravilhas. A sabedoria dele sai até pelo olhar. Homem culto e finíssimo. Que família linda. Conheci uma das filhas e duas netas, entre elas, uma menina de apenas três meses, me recepcionaram muitíssimo bem. A netinha nem chorava, ela era parte da paz daquela casa. Olhava para mim e me presenteava constantemente com o belo sorriso sem dentes tão típico da idade.
No quarto do casal, uma varanda que permitia à vista para o apaixonante jardim com a palmeira que eu tanto admirei. Ah, uma biblioteca não basta para um casal culto. Na casa tem a biblioteca do marido e outra que é da esposa. Mais outra infinidade de livros. Fiquei louca! Eu adoro isso.
Enquanto ela me mostrava sua casa, as bibliotecas, as paredes cultas, o corredor intelectual, ela me disse:
- Voltei da feira nesse instante, nem arrumei minhas compras ainda.
- Não se preocupe, eu a ajudarei nessa tarefa.
 Essa doce senhora nem parecia estar preocupada com a feira que tinha para organizar, pois estava calmamente declamando para mim um de seus poemas. Quanta honra! Uma casa que respira também poesia. E ainda me perguntou se eu tinha gostado...
Arrumamos a feira e logo em seguida fomos nos organizar para prestigiarmos o evento que me levou a conhecer essa casa. Fomos. A noite foi maravilhosa, poesia pura. Papo de gente inteligente. Eu aproveitei tudo daquele momento. Voltamos para casa quase duas horas da madrugada. Pensei que iria dormir, mas a minha atenciosa amiga apontou para uma lâmpada, daquelas de cabeceira e me disse: “Coloquei-a aí caso você queira ler algo antes de dormir”. Mais uma vez fui surpreendida naquela recepção calorosa: “Espere um pouco, tenho algo para você!”. Ela me trouxe um livro de sua autoria, sentou na cama ao lado e começou a relatar o escrito como uma verdadeira contadora de histórias. Isso me levou à minha infância, quando minha mãe contava algumas histórias para mim, sempre antes de dormir. Pensei: “Que privilégio, conseguir reviver os tempos de criança aos 34 anos de idade”.
Contou-me com entusiasmo “As lendas de Igarapeba” e eu fiquei imaginando como seria o “Homem das canelas grandes”. Seria ele assustador para as crianças igarapebenses? E a “Pedra que ronca”? Será que ela ronca mesmo? Fiquei com vontade de conhecer tudo! Arrependi-me porque não registrei o momento que ela me contava essas histórias com uma fotografia, mas depois me perdoei: “Ninguém consegue fotografar sonhos e o que eu estava vivendo naquele momento mágico era parte de um sonho”. Depois das histórias, tomei banho e fui dormir. Geralmente estranho a cama dos outros, o sono demora para me vencer, mas lá eu caí como “uma pedra que ronca!”
Acordei cedinho, a mesa do café já estava posta e logo após eu voltei para minha casa. Durante minha viagem de volta fiquei pensando na receptividade tão maravilhosa, naquela família tão incrível, na cultura das paredes, na sabedoria do corredor... O sonho que tive acordada foi lá na casa da amiga, poetisa e imortal da Academia Palmarense de Letras, Socorro Duran.
É o tipo de casa que sempre idealizei para mim. Tudo que eu vivi ali parecia um sonho. Mas, era um sonho de casa, ou a casa do sonho? Será que nesse caso a ordem das parcelas altera o produto? Acredito que não. A casa de dona Socorro Duran é mais uma prova que a Matemática é realmente uma ciência exata. Ou seja, é a casa dos sonhos e ela promove sonhos.



Obs: Texto escrito em 17 de dezembro de 2015. 

domingo, 29 de maio de 2016

A MÁFIA DOS POEMAS

Tenho uma duvida pertinente:
Será que você ao menos desconfia
o que uma poetisa sente
quando vê seu sorriso pela frente?
Na verdade você vai morrer sem saber
é impossível em palavras descrever
de forma clara e precisa
como tua boca me escraviza.
Fico sem saber o que fazer
a maneira como devo proceder
Para te dizer: “Estou aqui
não me deixe partir...”
Pego o papel, a caneta e escrevo
minha admiração e me atrevo
a te definir em meus versos
e nas metáforas confesso
aquilo que você desconfia
sobre os sinais da poesia.
Falar aquilo que sente
de maneira soletrada
nem sempre é o caminho
para uma pessoa letrada.
isso é muito óbvio
fujo do público e notório
e para te expor meu dilema
recorro à máfia dos poemas!
Uma vez nela envolto
não há como você fugir
nem vivo, nem morto!

quinta-feira, 26 de maio de 2016

INDEPENDÊNCIA X ROCK IN RIO




Na época da universidade, minha mãe tinha um amigo roqueiro “muito cabeça”. Ele tinha iniciado um curso de física e parou para cursar psicologia. No primeiro Rock in Rio, em 1985, este amigo cabeça, convenceu minha mãe a acompanhá-lo a este mundialmente famoso show de rock. Na verdade, minha mãe nunca curtiu rock, mas era completamente apaixonada por Fred Mercury. Como ela sabia que este cantor seria uma das principais atrações, deu sua palavra ao amigo: “Eu vou!”
Mas tinha um detalhe (os detalhes sempre são interessantes): Ela era apenas uma universitária e não tinha emprego, quem pagava seus estudos era minha avó Sílvia Reis. Minha mãe chegou em casa “com a cabeça feita pelo amigo cabeça” e afirmando:
-Mãe, vou para o Rock in Rio!
-Vai nada! Aquilo é uma festa de doido, só tem maconheiro e você não vai de jeito nenhum!
-Vou porque eu já sou “maior de idade” e sou independente!
Olha só que tamanha ousadia! Nem trabalhava, minha avó já pagava a faculdade dela e ainda tomava conta de mim, para que ela tivesse a oportunidade de estudar porque nessa época eu tinha apenas quatro anos. Indignada, minha avó desafiou: "Quero ver como você vai arrumar dinheiro para fazer essa viagem!".
Isso não era um problema. Minha mãe não tinha emprego fixo, mas sempre teve muito talento para vendas. Certa vez ela conseguiu vender um brinco que estava na orelha da minha avó. Nessa época ela vendia bijuterias e uma de suas clientes, chamada Sônia, olhou todas as bijuterias disponíveis, mas achou de gostar justamente do brinco que minha avó estava usando. Prontamente minha mãe falou:
-Você quer este brinco? Eu vendo!
Minha avó sem acreditar, questionou:
-Como é a história? Você vai vender o brinco que está na minha orelha?
-Vá mãe, tire o brinco! A senhora não está vendo que Sônia gostou do seu brinco? A cliente sempre tem razão, me dê o brinco que depois lhe dou outro!
E vendeu!
Com todo esse talento e criatividade, não foi difícil arrumar o dinheiro para a viagem. Ela pegou todas as bijuterias que tinha em casa para vender e resolveu fazer uma rifa. Quando ela chegou à faculdade e contou para os amigos o “drama” dela e a paixão por Fred Mercury, todos a ajudaram.
Cumpriu a palavra, foi para o Rio de Janeiro. Lá chegando, ficou hospedada na casa de uma prima nossa, Carmem, e foi muito bem recepcionada. Pela manhã, tomava café ao som de um piano, porque minha prima toca divinamente e era um ritual dela só sair para o trabalho depois de tocar esse instrumento. No jantar, comia caviar e tomava vinho. Conheceu os principais pontos turísticos do Rio e estava se sentindo uma rainha. Mas ela não sabia o que a aguardava...
O Rio de Janeiro estava em festa, não se falava em outra coisa. Os ônibus só tocavam rock, os shows praticamente começavam pelo meio da rua. Ela estava radiante de felicidade. Apesar de ter sido imperativa com minha avó, elas duas são unha e carne, então todo acontecimento era motivo para minha mãe ligar para minha avó:
-Mãe, aqui está maravilhoso!
-É mesmo? Você já viu Fred Mercury?
-Ainda não. Ele vai se apresentar amanhã, mas o Rio está em festa, a senhora precisava ver a animação desse povo, tem gente do mundo inteiro!
Por incrível que pareça, minha avó ficava animada em saber as novidades e minha mãe ficava satisfeita com a animação dela, mas não esperava o que estava por vir...
No dia da apresentação de Fred Mercury, minha mãe chegou ao local do show com dez horas de antecedência. Conseguiu o melhor lugar, ficou cara a cara com seu ídolo e não duvido nada que ela tenha conseguido o feito de cantar “Love of my life” mais alto que o cantor. Estava deslumbrada, até hoje, afirma que realizou no Rock in Rio um dos maiores sonhos da sua vida.
Acabada a temporada do rock, minha mãe começou a arrumar as malas para voltar à vida “independente”. Gastou todo o dinheiro nos shows e chegou em casa mais lisa que muçum. Minha avó estava morrendo de saudades dela, conversaram muito, mainha contou os mínimos detalhes e a emoção em ver Fred Mercury de pertinho. Tudo estava bem, ou pelo menos parecia...
A data da renovação da matrícula da faculdade estava muito próxima. Minha mãe tinha apenas três dias para resolver isso. Passou o primeiro dia, o segundo, quando foi no terceiro, tomou uma dose de coragem forçada e pediu para minha avó:
-Mãe, me dê o dinheiro para eu renovar a matrícula da faculdade.
-Como é a história? Você quer dinheiro pra quê? Para renovar a matrícula da faculdade? Lembra que você disse a mim que é independente? Quem é independente tem condições de pagar a faculdade. Se vire!
-Deixe de brincadeira, mãe! Me dê o dinheiro, hoje é o último dia...
-Eu disse que você não fosse para aquela festa de doido, foi porque quis. Vá trabalhar e pague sua faculdade.
E não deu o dinheiro mesmo não!
Mainha entrou em desespero, foi para a faculdade ver se conseguia negociar (afinal, negociar é a praia dela), mas tinha um porém...
A diretora da faculdade era uma freira e mainha ficou pensando: “Pronto, se eu disser para esta senhora tão religiosa, que gastei o dinheiro da matrícula porque fui para o Rock in Rio, ela vai agir como minha mãe e vai dizer: “foi para aquela festa de doido porque quis, perdeu sua matrícula!”. Ela começou sua negociação:
-Irmã, eu estou sem o dinheiro da matrícula e não posso deixar de estudar.
-O que você quer que eu faça, minha filha?
-Quero que a senhora faça um termo de compromisso para eu assinar. No final do ano (isso era fevereiro ainda...) eu pago todas as mensalidades.
Tinha uma engraçadinha na fila que disse: "Você vai ganhar na loteria?".

Inacreditavelmente, ela conseguiu convencer a freira, assinou o termo de compromisso, concluiu a faculdade, pagou sua dívida com o dinheiro da venda das bijuterias e minha avó nunca mais a ajudou com as despesas do curso. No embalo do rock, minha mãe aprendeu o verdadeiro sentido da palavra independência. O mais interessante é que até hoje elas moram juntas e são sentimentalmente falando, completamente dependentes uma da outra, minha mãe diz que o amor dela por minha avó é “super eterníssimo”. Até que o próximo Rock in Rio não as separe...

quarta-feira, 25 de maio de 2016

APAGÃO

Parece que minha escuridão exteriorizou-se
mas como tudo tem seu dualismo
percebi que a situação era favorável.

A sociedade estava vendada
num breu total.

Tomei coragem
me destranquei
corri de mim
naquele momento eu era minha única vilã
aprisionei minhas sombras
para que nem elas me seguissem.

Esqueci de mim para não me julgar depois
mesmo sem saber tua morada
te encontrei pela tua essência
encorajei meus medos.

Te encontrei e te invadi
baixei a tua imunidade
mudei teus conceitos tão parnasianos
eu te baguncei inteiro
assanhei esses cabelos comportados
eu te consegui!

Silenciei tuas palavras
com mão, boca, pernas...

A escuridão reinava
ela estava ao nosso lado
a sociedade escutava nossos sussurros
mas não nos viam
e as más língua não podiam denunciar

Como o encanto da Cinderela tinha hora pra acabar
sabíamos que as luzes voltariam
então eu te cansei
e corri
de você
de nós
dos olhos alheios.
 Voltei pra mim...
...saciada.

E quando o apagão acendeu
vi que todo esse intenso prazer aconteceu
enquanto eu muito quieta estava
em minha casa
em meu terraço
em minha rede
a contemplar o luar...

Mas fique em alerta:
no próximo apagão
eu lá estarei.

novamente...


OBS: Poema publicado em meu livro "Mistura Heterogênea - Poemas, contos e crônicas".

terça-feira, 24 de maio de 2016

NECESSIDADE PRIMEIRA!

A madrugada ainda se faz presente
como sempre, fria, escura e solitária
a janela do meu quarto é invadida  pela praia
anunciando que muita chuva vem pela frente.
Meu relógio marca quase quatro
Olhos pesados, quase fechados
meu maior componente ainda é o cansaço.
Não sei ao certo como as palavras estão saindo:
Será isso um poema escrito ou sonhado?
tenho dúvidas se sou um ser acordado,
se Morfeu está escrevendo por mim,
ou se o eu lírico trabalha enquanto durmo.
De certeza mesmo, eu assumo:
Que nesse exato momento
estou buscando o teu sorriso
para começar a tomar o meu rumo
na vida preciso desse brilho.
Para clarear tuas ideias, explico:
Isso é para mim poético e profético
se eu não provar teu sorriso
mesmo que nessa distância tamanha
meu dia não começa de jeito nenhum
prefiro nem sair da minha cama!

segunda-feira, 23 de maio de 2016

TUA!

Nunca, em todo meu tempo de vida
estive diante de um homem que fosse capaz
de usar essa tua doce ousadia
para me encantar com esse teu jeito.

Nos tempos de hoje, analise e me responda:
Como se conquista antes do primeiro beijo?
Você soube realizar esse feito
de maneira simples mas muito arrasadora.  

Por várias vezes em apenas um dia
me pego buscando tua foto 
seja dentro de mim ou nas redes sociais
e basta eu passar meus olhos de relance
na tua figura imóvel mas ao mesmo tempo inquieta
para sentir todo o comprometimento
da minha estrutura até então de cimento
e ter a máxima certeza 
que és para mim a imagem do amor.

Teu sorriso numa simples foto provoca o meu
teu olhar é tímido mas certeiro
me desintegra em fração de segundos
tua boca autoritária me comanda
sem proferir uma mínima ordem
acredito que nem sabes que isso seja possível.

Posso te garantir que esse domínio
ninguém jamais me exerceu
me pego pensando em ti:
quando você será meu?
Terei esse privilégio algum dia?

Eu espero que sim
pois sei que sou toda tua
sem ter tido ao menos
um beijo teu.

domingo, 22 de maio de 2016

A FESTA DE AREIA!

          Hoje eu acordei com gritos fervorosos, palmas frenéticas, gargalhadas gostosas, que vinham da praia. Era uma festa! Eu escutava repetidamente: “Parabéns pra você, nesta data querida...”, essa movimentação se deu aqui, bem em frente à minha casa. Não, hoje não é o meu aniversário. Fui averiguar essa bagunça boa. Eram crianças de uma escolinha daqui de perto. As tortas eram de areia e elas foram “confeitadas” com flores. Uma perfeição!
            As crianças ficaram ao redor das três imensas tortas e cantavam com fervor. Tive vontade de perguntar se uma criança grande, assim como eu, poderia participar também. Mas ser penetra é uma coisa muito feia, aprendi isso na minha infância. Fiquei observando...
Fui buscar o meu celular para bater uma foto das tortas, mas quando cheguei, elas já haviam sido pisoteadas, depois percebi que não, não haviam sido pisoteadas, as crianças haviam degustado essa “guloseima de areia” num faz de conta tão típico da idade.
            Pensei: Que grande lição aprendi hoje! Fizeram uma grande festa, sem nenhum recurso financeiro. Enquanto alguns adultos gastam até o que não possuem para impressionarem com suas festas. Eu bem que gostaria que aquela comemoração de areia tivesse sido para mim. Não tenho dúvidas que esse seja um exemplo claro da sabedoria das crianças tão citada na Bíblia. Fiquei encantada!

A ORQUÍDEA!

Para Uma grande amiga que
cultivo há quase
 duas décadas: Cibelle Lins (Simba)
Hoje é o aniversário de uma grande amiga, Simba!
E ela me disse: “Suya, de repente trinta!”
Me dei conta que metade dessa idade
tem a nossa inestimável amizade.
O que eu vou comprar de presente
para essa pessoa até longe nunca ausente?
Roupa, relógio, sapato, batom?
Não, isso nem de longe carrega meu dom.
Tinha que ser algo bonito
um presente vivo!
Que a fizesse lembrar de mim
caso eu ao seu lado estivesse
ou bem distante, lá em Pequim.
Lá no fundo meu peito ardeu
e uma voz para mim sussurrou:
“Tem um tipo de presente que ela jamais ganhou!”
Foi quando eu agi com muita perícia
e resolvi comprar uma Orquídea.
No orquidário eu entrei e quase enlouqueci
cada espécie mais linda que a outra
Quando de repente olhei para uma em especial
e imediatamente falei para a vendedora:
“Estou vendo o rosto da minha amiga naquela ali!
Seria um crime sem ela dessa loja sair”.
Ao chegar na casa de Simba
eu tratei logo de adiantar:
“Essa bela flor acabou de sair do orquidário
tenha com ela o mesmo cuidado
que teve o Pequeno Príncipe com sua rosa
providencie uma redoma de vidro, sem demora!"
A intenção foi dar um presente inesquecível
sei que uma flor é algo perecível
que algum dia ela irá morrer
mas sempre que Simba escutar a palavra “orquídea”
ela de mim irá lembrar
esse tipo de flor irá reviver
e do meu presente ela jamais irá esquecer.

sexta-feira, 20 de maio de 2016

SEM CORAÇÃO POR ALGUNS SEGUNDOS

Gostaria imensamente de conseguir entender
a multiplicidade de sensações que ocorrem em mim
e essa autoridade que exerce o verbo “querer”
quando estou no mesmo ambiente que você:

As mãos ficam geladas e aflitas
as pernas ansiosas e trêmulas
não há em meu corpo uma partícula
que possa discordar desse tema.

O corpo enlouquece, esquenta!
Minha boca sempre condena
através de um teimoso sorriso
o quanto de ti eu preciso.

As palavras até que ficam tímidas
com comportamento tal qual menina
mas quando tento dominar meu olhar
é um desastre, posso afirmar:

Quanto mais ordeno
que ele fique sereno
de mim ele não se compadece
escancaradamente desobedece.

Ele vem e autoritariamente me comanda
repetitivo e suave como um mantra
me colocando irreversivelmente na parede
dizendo que nunca terei domínio sobre ele:

“Não adianta tentar esconder
as sensações que vibram em você
quanto ao homem que hoje é o seu mundo
simplesmente porque quando você o vê
fica sem coração por alguns segundos”.

E continuou a me bombardear:
“Nesse momento de sua ausência cardíaca
onde você acha que seu coração se encontra?
Respondo logo sem nenhuma delonga
que é dentro do peito do homem amado
que seu coração está bem guardado”.

quarta-feira, 18 de maio de 2016

UM NOVO AMOR!

 Um dia aparentemente igual a todos os outros. Pela manhã, eu estava dividida entre os afazeres domésticos, livros e textos (sim, isso é possível!). Quando eu estava me organizando para trabalhar, o celular tocava incansavelmente. Era o danado do Whatsapp. Não parava! Quem será que está freneticamente desesperado para falar comigo? Fui olhar com uma curiosidade que não cabia em mim. As mensagens diziam o seguinte:
“Bom dia!!! Estás fazendo o quê??? Fala comigo!!!! Ei... Ei... Ei...”.
            Quanto desespero! Aconteceu algo muito sério, ou é uma saudade já puxando para o banzo. Só então parei para ver quem estava naquela aflição toda. Era
Nayara, minha irmã (a minha Amarela!). Tentei responder todas às perguntas dela com a mesma rapidez: “Estou em casa, me preparando para um banho, vou trabalhar. Estou um pouco atrasada, mas vai deixando as mensagens aí que assim que eu puder eu te respondo!”.
 Bem, eu sou uma criatura que respondo imediatamente qualquer tipo de mensagem, não deixo ninguém esperando. Mas eu estava realmente atrasada e pretendia responder assim que terminasse de tomar meu banho. Mas Nayara metralhou na mesma agonia inicial: “Estou grávida!!!! Você vai ser titia!!!”
   Pronto! Bateu uma felicidade incrível! Indefinível! Primeiro sobrinho. Procurei palavras adequadas para expressar esse sentimento novo, mas parece que elas se esconderam lá no Triângulo das Bermudas! Continuei:
    -Ai que lindo!!! Quero que nasça logo!! Já estou amando!!! 
    -Estou com seis semanas. Fiz o teste hoje!
    Esqueci do trabalho! Quando eu olhei a hora: cinco minutos para sair de casa! Tomei o banho mais mal tomado da minha vida, peguei a primeira roupa que encontrei pela frente, bati a porta de casa e saí. Detalhes: Esqueci de tudo! Esqueci de almoçar, de pegar minha bolsa, carteira e dinheiro! Fui embora, sem nenhum material para carregar, mas cheia de felicidade e um amor imenso. Quando eu estava muito bem sentada no ônibus, lembrei que tinha esquecido tudo e mandei essa mensagem para ela:
     -Você é "ótima"! Por sua causa, vou ficar sem almoçar. Esqueci de tudo, até do dinheiro!
     -kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk – Ela me respondeu “romanticamente”.
      Comecei a fazer meus projetos:
     -Olha Nayara, vamos combinar: primeiro sobrinho tem que ser a cara da titia! E o primeiro nome que ele vai aprender: titia maravilhosa! Ah, manda Marcelo (meu cunhado) pedir transferência pra cá, porque eu não quero ser "tia longe", quero ser "tia perto"! Podia ser gêmeos, né?! Eu iria adorar!
      Bem, eu já tenho quatro lindas crianças que amo muito, os meus filhos. Agora, está vindo a minha quinta criança. Se brincar, eu estou mais ansiosa que ela. Não sabia que amor de tia era tão grande. Quero uns dez sobrinhos, no mínimo! Estou extremamente feliz e emocionada, me sinto grávida novamente.
      Titia maravilhosa ama enlouquecidamente esse garotinho que ainda está na barriga!
     Ah Nayara, sinto informar: Você ficou no canto! Minha prioridade agora é esse bebê lindo que você carrega! Agora eu sou menos irmã e mais titia!
Para Nayara (minha irmã) e Luiz (meu sobrinho maravilhoso
 e razão de todo o meu abestalhamento! Rsrs)

OBSERVAÇÃO: Texto escrito há 1 ano, quando recebi essa notícia que seria a titia mais maravilhosa desse mundo!

terça-feira, 17 de maio de 2016

SINTO SAUDADE DAQUILO QUE NUNCA ACONTECEU

Adianto logo que será um texto confuso e a intenção é realmente essa. Porque saudade é algo pra lá de complexo. A começar pela palavra em si: não há tradução e só existe na Língua Portuguesa. Sou inimiga mortal da saudade convencional. Posso explicar isso bem direitinho utilizando o trecho de uma música muito conhecida: “E por falar em saudade onde anda você /Onde andam seus olhos que a gente não vê / Onde anda esse corpo que me deixou louco de tanto prazer?”. Uma definição perfeita! Só sentimos saudades daquilo que tivemos e não temos mais. Seja pela distância, pelo fim de um relacionamento ou até mesmo pela situação mais extrema: a morte. Nesse caso, a saudade é irreversível.  Em minha sã consciência, afirmo que não vejo razão para gostar desse tipo de sentimento que só se faz presente pela falta de um momento esplêndido, com um alguém memorável, mas que a vida com suas complicações acaba se encarregando de impossibilitar que tenhamos na hora que queremos e bem entendemos a satisfação desses momentos.
A saudade é tão impiedosa que é comum escutarmos: “Precisamos matar a saudade!”. Matar! Vejam que verbo mais cruel. Alguém que é bom do juízo pensa em matar alguém que se ama? Nem na última das hipóteses. Se fosse algo bom, o correto seria afirmar: “Precisamos viver essa saudade!”. Até se vive, mas nessa circunstância: na ausência do ser amado. Quando você cria um momento para “matar a saudade” e consegue ter em seus braços a razão criadora dela, ninguém diz assim: “Eu estou com saudades de você!”, porque a presença física mandou a saudade para longe e deu lugar para os abraços, amassos, prazeres. Agora sim, cheguei onde queria: Gosto da saudade morta!
Mas estou descobrindo outra face da saudade. E isso anda me surpreendendo, por ser algo diferente: Uma saudade daquilo que não tive ainda. É uma mistura de esperança com uma pontinha de certeza de que o momento que não vivi ainda vai acontecer. Isso é motivador. Alguém deve estar se perguntando assim: “E isso lá é saudade? Se não aconteceu ainda, pode ser ansiedade...”. Não deixa de ser também, é uma mistura. Entretanto não é aquele tipo de ansiedade que perturba, que inquieta, que tira o sono. É algo leve. Como Jorge Vercillo garante em uma de suas canções: “Só de pensar em você já me faz tanto bem”. É isso! Sinto esse tipo de sensação por um alguém que nunca foi meu. Dele tive apenas olhares, e, diga-se de passagem: que olhares! Diferentes dos que estou acostumada a ganhar por aí. Tem um quê de admiração, respeito, até de desejo, mas administrado da maneira mais sábia possível. Sinto saudade desse tipo de olhar que me faz bem e eu sei que terei de novo. Dele eu tive também um aperto de mão, diferente dos demais. Senti a energia positiva de quem me disse através de um simples toque que não deseja apenas assim como eu, ter uma pessoa para satisfazer desejos carnais e no outro dia: “Como é mesmo o nome daquela pessoa que estive ontem?”. Isso é algo tão normal na sociedade de hoje e eu não consigo entender o porquê dessa normalidade tão bem aceita. Ah, e o abraço? Sim, tivemos alguns, assim, bem breves, mas foi muito melhor que muito abraço hipocritamente bem demorado. Houve sinceridade no gesto.
Todos esses comportamentos que envolvem respeito (que é uma palavrinha que está entrando em extinção porque existem poucos exemplares da espécie dela no mundo) tornam claríssimo para mim que já conheço o sabor do beijo que nunca provei. E eu posso garantir mesmo sem provar que já gostei. E quero repetir! (Rsrs). Ou tornar realidade, para ser mais clara. Se isso é paixão, amor ou desejo eu não sei, tenho dúvidas, mas de uma coisa eu tenho certeza: É uma saudade daquilo que nunca aconteceu e dessa nova versão da saudade eu tenho algo a dizer: Ahhh, dessa eu adoro! E entenda quem puder...  



OBSERVAÇÃO: "Sinto saudade daquilo que nunca aconteceu" seria um poema, mas uma grande amiga chamada Sandra Silva, disse que não queria que eu escrevesse um poema com esse título porque eu seria muito técnica e metafórica, queria mais nitidez. Ser grande amiga de uma escritora tem essa vantagem de exigir o formato de um texto, rsrs. Dedico então esse texto para ela. Beijão para você, Sandrinha.

domingo, 15 de maio de 2016

CARTA PARA CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


São José da Coroa Grande, 07 de dezembro de 2015.

Caro Drummond:
Admmauro Gommes e eu, no dia da minha posse
 na Academia Palmarense de Letras
(05 de dezembro de 2015)
Infelizmente você não estava presente em minha posse, no dia 05 de dezembro de 2015, na Academia Palmarense de Letras (APLE). Eu sei que o tempo e o espaço não permitiram a sua presença, entendo. Não se preocupe, eu te perdoo. Justamente por isso, resolvi te manter informado sobre algumas coisas da atualidade no campo literário. Vou repetir umas palavras que falei em meu discurso na APLE e algumas particularidades. Pois é, meu caro amigo imortal, passei dez longos anos sem estudar e durante esse tempo encarei um emprego cansativo como merendeira. Enquanto cozinhava para quinze salas de aula, decidi que não passaria o resto da vida esquentando a barriga no fogão e esfriando na pia. Retomei os estudos e fiz algumas escolhas importantes: A FAMASUL por Faculdade, Letras seria o meu curso e lá chegando, escolhi Admmauro Gommes como o meu maior exemplo. Tenho certeza que você gostaria de tê-lo conhecido. Não sei se serei feliz nas definições, mas tudo isso tem explicação. Tentarei relatá-las.
                No meio acadêmico, percebi que não era somente o eu-lírico do seu poema que tinha uma pedra no meio do caminho. Eu também tinha uma imensa e fixa pedra no meio do meu caminho. Comecei a desconfiar que você escreveu esse poema para mim...
Ela tinha um nome: Insegurança. Gostava muito de escrever, mas eu escrevia somente para mim, lá uma vez ou outra eu mostrava meu texto para alguém e logo em seguida o guardava. Eram poucas as pessoas que sabiam que ler e escrever, eram as minhas maiores paixões. Eu acreditava que só escrevia besteiras, bem, na verdade eu continuo achando isso.
                Essas paixões fizeram com que eu chegasse à FAMASUL, eu queria aprimorar a minha técnica e eu sabia que existia uma disciplina que me ajudaria bastante: Literatura! Porém, isso não seria algo assim tão fácil...
Havia um alguém à frente dessa disciplina: Ele! O temido Admmauro Gommes. Temido? Sim! Todo profissional tem um currículo desconhecido, aquele “documento” que passa de boca em boca, de ouvido em ouvido, como aquela brincadeira de infância “telefone sem fio”, sempre praticada numa constante conversa entre os ex e os futuros alunos do professor em questão. E o que eu ouvia falar sobre ele era que estudar era a sua ordem. Esse professor, segundo os relatos, era um dos melhores da faculdade e não aliviava para aluno. Exigente ao extremo, poeta, escritor de mais de vinte obras. Uma referência no mundo literário. Pessoas desse nível realmente não costumam aliviar. Então, eu sabia bem que deveria me doar ao máximo. E a minha pedra, Drummond? Como eu iria retirá-la, tendo um professor tão exigente? A pedra só aumentava a sua grandeza.
Deixe que eu apresente melhor esse meu professor: Admmauro tem a mania de contar seus textos: “Eu escrevi mil e duzentos, mil e quatrocentos poemas...”. Não sabe ele que nesse aspecto ele está errado (esse foi o único erro que eu encontrei nele, acredite!). Na verdade ele não tem a mínima noção de quantos poemas já escreveu na vida. É impossível chegar a esse número. Sou testemunha da quantidade absurda desse tipo de texto que este homem criou durante suas aulas. E esses poemas? Foram contados? Registrados? Foram publicados em algum livro? Não, infelizmente não! Foram criminalmente apagados por outro professor que posteriormente entrava na sala e precisava do quadro para ministrar sua aula. Então, está mais que provado que Admmauro se perdeu nessas contas, concorda comigo?   
Esses poemas que não foram registrados eram assombrosos para mim. Eu pensava assim: “Como isso é possível? Ele chega com a maior naturalidade e metralha versos nos alunos. Cria poemas com uma facilidade ímpar, são metáforas inquietantes e criadas em fração de segundos”. Essa grandiosidade toda me intimidava. Eu tinha uma vergonha fora do normal de mostrar um escrito meu para ele. Minha “escritora interna” me alertava: “Você não é louca de mostrar as besteiras que você escreve para esse homem que é uma verdadeira máquina de fazer versos, né? Você vai ser ridicularizada, no mínimo! Ele vai pegar seu texto pela ponta do papel, sacudir, e te perguntar olhando no fundo dos seus olhos: ‘Que porcaria é essa, Sylvia Beltrão? Não foi isso que eu te ensinei!’. Eu não pensava em outra coisa. A minha pedra só crescia e inexplicavelmente a minha admiração por ele crescia em igual proporção, ao ponto de eu prometer para mim que faria o possível para tentar ser um plágio daquele profissional.
Eu o estudava, pesquisava, analisava constantemente. Para ser bem sincera, eu continuo fazendo isso. Mas o que mais me impressionou foi o fato de Admmauro me convidar para participar de uma entrevista com o poeta Vital Corrêa de Araújo (outro que você deveria conhecer). Ora, ele nunca tinha lido um poema meu. Aliás, nem eu nunca tinha lido um poema meu, porque eu simplesmente não escrevia poemas. Sim e qual foi a razão de convidar alguém que não “poemava” para encontros de poesia? Eu não sei até hoje essa resposta, porque metade de Admmauro é enigma.
Eu só sei, Drummond, que eu decidi ir porque eu sou fascinada pela Literatura e objetivava aprender mais com esses dois poetas. Mas isso me inquietava tanto, eu ficava me questionando feito uma louca: “Como é, Sylvia? Vai escrever nenhum poema não, é?! Você cursa Letras, é fissurada em Literatura, participa de todos os encontros por prazer. Conhece as técnicas para a produção de um poema. O que te falta? Vai continuar nessa de ficar só ouvindo os poemas dos outros? Se for para continuar assim, é melhor mudar de curso, não acha não?”. Eu vinha nesse meu interno dilema poético justamente no mesmo período em que Admmauro me apresentava aos outros como “poeta” e isso era para mim inadmissível: “Não, de jeito nenhum, claro que não, eu não sou poeta!”, mas ele dizia com aquele sorriso meio de lado bem típico dele: “Você é poeta, Sylvia, você só não descobriu isso ainda”.
Pronto, bagunçou tudo em mim! A minha escritora interna começou a vir com uns lances quase indefiníveis, me dizendo metaforicamente (me preparando, acredito) que eu deveria sim ao menos tentar, arriscar alguns versos microscópicos. “Vamos lá!”, eu prometi isso para ela.
Escrevi o meu primeiro poema na Faculdade: “Terror verde”. Lembro como hoje da timidez que tive ao enviar esse texto por e-mail para ele (e-mail é outra coisa que você também precisava ter conhecido!). Nunca foi tão difícil apertar a tecla “enviar”. Pensava: “Ele não vai gostar! Por que eu enviei isso, hein? Que besteira eu acabei de fazer...”. Para a minha frenética surpresa, ele gostou. E eu custei a acreditar nisso. Bem, se gostou do primeiro, vou tentar o segundo. A crítica foi positiva. Ah, vou para o terceiro! Nessa brincadeirinha, Admmauro conquistou a minha confiança e eu comecei a enviar os textos guardados que eu não mostrava para ninguém. Fiquei “sem-vergonha”, no bom sentido da palavra, lógico! Ao ponto de enviar as maiores besteiras que eu já escrevi na vida, coisas que eu teria coragem de mostrar para qualquer pessoa, menos para ele porque sabia que ele acharia aquilo ridículo, mas eu não me importava mais com isso. Admmauro passou a ser para mim o homem de extrema confiança textual e eu queria mesmo que ele apontasse os meus erros. Eu precisava crescer, aprimorar a minha técnica, afinal, o objetivo maior no Curso de Letras para mim era esse. Pois, acredite se puder, caro amigo, Admmauro foi diminuindo gradativamente o tamanho da minha pedra. Ele deu muitos olhos para os meus textos até então invisíveis. Me convenceu a publicar um livro. Veja que audácia! Meus textos ganharam vozes e através desse imenso incentivo de Admmauro – lógico que essa “culpa boa” foi dele - eu cheguei a ocupar a cadeira 29 de uma Academia. Maravilhoso isso, não acha?
Quando eu recebi essa notícia que me queriam na APLE, eu saí de lá feito uma louca, digitando um monte de mensagens pelo celular (outra coisa que você não conheceu), pelo meio da rua. Coisa de doida mesmo. Eram agradecimentos e intimações do tipo: “Minha posse será no dia 05, não falte, arrume um tempinho para mim, nem que sejam por dois minutinhos...”. Súplicas mil! Ele me respondeu imediatamente, isso me tranquilizou porque eu sei que a outra metade de Admmauro é cumpridora das promessas. Então, se ele deu sua palavra, ela seria cumprida. Porém, eu imaginei que seria uma passagem breve, pois a agenda dele é sempre muito cheia.
Fui surpreendida, ele é mestre nisso! Não somente participou do evento inteiro como discursou sobre os meus textos (os mesmos que eu escondia dele!).  Disse maravilhas. Eu só sei que eu fiquei toda boba de felicidade. Ele falou como o maior conhecedor dos meus escritos, como o maior decifrador das minhas metáforas, foi muito incrível. Você perdeu tudo isso. E durante esse processo todo, enquanto Admmauro discursava, eu pensei muito em você, Drummond. Pensei na nossa pedra em comum. E pude concluir que seu eu-lírico não foi feliz porque passou o tempo inteiro se queixando da danada da pedra que tinha no caminho, mas nada conseguiu fazer para resolver esse transtorno. Bem, eu também passei um tempão me queixando sobre a enorme pedra que tinha no meu caminho, mas Admmauro foi lá, procurou o meu eu-lírico, e com um peteleco suave conseguiu retirar a pedra que tinha no meio do meu caminho. A prova disso está no fato de que antes de Admmauro, eu escrevia e escondia, depois de Admmauro, eu escrevo e publico para o mundo.
O eu-lírico dos meus poemas defende hoje a seguinte ideia: “Admmauro disse que não existe mais pedra no meio do caminho de Sylvia, ele a retirou!”. Está vendo, Drummond, como ele é tão genial? Eu bem que disse: Você deveria ter conhecido ele, ou pelo menos, o eu-lírico do seu poema...


Um abraço imortal de Sylvia Beltrão!

OBS: Escrevi esta carta em forma de agradecimento e reconhecimento ao meu maior exemplo literário, meu professor: Admmauro Gommes.